Quando eu era menina, meu pai tinha uma loja na garagem de casa. Nossa rua misturava imigrantes de vários países com migrantes nordestinos, alguns artistas e muito tráfico de drogas.
Já na escola estadual, quando fui estudar com meus vizinhos usuários e traficantes de drogas, aprendi a conviver com eles e saber que são pessoas como nós, que têm família, sonhos, altos e baixos. Sorriem e se emocionam, têm amigos, e muitas vezes passam imperceptíveis na comunidade. Claro, sempre houve o receio, o medo de sofrer violência, a falta de identificação até mesmo cultural, mas passamos a vida toda sendo vizinhos, de certa forma "respeitando-os" e sendo respeitados por eles, num pacto de silêncio conveniente às duas partes.
Voltando a quando era menina, no portão de casa esperando meu pai chegar, um deles passou na rua e deixou cair um pacotinho bem na minha frente, e eu, mesmo do alto de minha inocência, quando notei o que era, fechei o portão e subi correndo com o coração disparado. Contei tudo para minha mãe que serenamente me instruiu a ficar em casa, esquecer o ocorrido e deixar isso pra lá. Claro, logo que minha mãe se distraiu eu voltei pro portão pra ver se o pacotinho ainda estava lá, mas claro, não estava!
E de lá para cá continuei convivendo com usuários e traficantes pobres e também muito ricos, mas nunca mais nenhum deles me ofereceu droga alguma, além das lícitas.
Se na Pompeia, um bairro badalado, temos esse contato tão íntimo com as bocas de fumo, o que dizer dessa comunidade que vive apinhada e afunilada em corredores estreitos, vítima da exclusão social? Mas tanto lá como cá temos o alto índice de usuários, que são motoboys, dentistas, juízes, advogados, professores de educação física, analistas de sistemas, empresários, funcionários públicos, artistas, motoristas, etc.
O que temos em comum? O desgosto pela vida! A pergunta que precisamos nos fazer para combater o uso de drogas é essa. Por que as pessoas usam drogas? O que nos aflige? Oprime? Desilude? Desanima? O que cada um de nós pode fazer para mudar essa dinâmica? É um problema imenso, maior que o mundo? Sim! Mas a resposta é quem sou eu em família, que profissão escolho para atuar nesse mundo, se dou bom dia, se tenho preconceitos. Se valorizo mais o dinheiro do que o resto, se vejo na competitividade uma ótima oportunidade de humilhar os outros. Se me enfeito tanto a ponto de diminuir quem está em volta. Se minha ambição passa por cima da alegria dos outros. Se meu orgulho faz o outro se sentir ínfimo. Se traio meu companheiro, ou a confiança do amigo. Se passo cheques sem fundos ou sou no trânsito uma ameaça aos outros motoristas.
Alguns vendem drogas, outros usam. Outros ainda criam ambiente favorável para que a desilusão se instaure. As drogas são invariavelmente um recurso de fuga da realidade. Nosso desafio é tomar atitudes que possam suprir o bem-estar proporcionado pelas drogas. Quem é você na cidade? Faz sorrir ou faz chorar?
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