sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Palmeiras e Corinthians

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(texto de minha autoria, em 2008, no Grupo dos Poetas do Tietê)

Era dia de clássico na cidade. Tinha gente que logo cedo já desfilava a camisa do time do coração sem medo de ser feliz. No trabalho, era aquela zoação... Quem se importa? O que vale é engrossar a torcida, fazer com que os onze jogadores virem milhares pelas ruas, aí sim o elenco ganha mais força.
Luís foi trabalhar com a camisa do Corinthians. Deslizava suave pela avenida enquanto sintonizava as notícias do dia. É hoje que o bicho vai pegar! Estatísticas de vitórias, de ataques e defesas. Previsão de público, entrevistas dos fanáticos. Tudo soprava a favor do Timão.
Mas ia tão distraído que não viu que o farol não estava mais verde e... tuuuummm... encheu de alegria a traseira de um carro parado. Desceu pra ver o tamanho do prejuízo e o motorista atingido tratou logo de berrar:
- Só podia ser corintiano!
- Que cê ta falando meu véio?
- Que só podia ser corintiano! Domingueiro, não sabe dirigir!
- Que dominguero o quê rapái? Você que parô no amarelo, senão dava pra nóis dois, seu bunda mole!
- Além de detonar meu carro ainda me chama de bunda-mole?
- É isso aí mesmo, vem falando que eu torço pro Corinthians, que sô domingueiro, nem me conhece! Sabe com quem cê tá falando?
- Não sei nem quero saber, só sei que vai pagar isso tudo, porque quem bate atrás tá sempre errado, não sabe não?
- Eu vô te processá por preconceito! Veio com essa de me chamar de corintiano maloquero! É porco né seu filho da puta?
- Porco é o teu nariz, sou sardinha e com muito orgulho!
- Menos mal... Se fosse do chiqueiro ia levar umas porrada.
- Do chiqueiro não sou nem morto, antes gambá que periquito.
- Gambá é a puta que te pariu.
- Minha mãe nãããoo!!!
- Foi mal véi, mãe é foda, desculpa aê.
- Tá legal foi culpa minha, fui eu que te chamei de gambá primeiro.
- É cara, verdade, eu tava distraído ouvindo rádio, que merda.
- Você tem seguro?
- Seguro não tenho não... Economizo tudo pra assistir meu Timão. Mas tem um chapa meu da oficina que conserta isso aí em dois palito, nem vai parecer que amassô, cê vai vê.
- Tá certo cara, vou confiar em você. Pode me dar seu telefone?
- Belê, tá na mão! 
Abriu a carteira para pegar um cartão quando o ingresso do clássico caiu no chão.
- Olha, caiu um papel aí.
- É meu ingresso pro jogo de hoje a noite.
- Que beleza! Hoje torço pra vocês. Esses pontos vão ajudar o Santos no campeonato.
- Firmeza, brother. Tá aqui meu cartão. Me liga amanhã bem cedo pra gente vê isso aí.
- Tá certo, vou levar na confiança. Boa sorte no jogo de hoje.
- Falou, cara. Torce junto, vamo ganhá de lavada, passá perfume na porcalhada.
Nessa hora, um palmeirense que vinha passando botou a cabeça pra fora e berrou sem medo de ser feliz:
- Aê animal! Sabe dirigir não? Só podia ser ultimão!
O corintiano, verde de raiva, mal se despediu do lambari e nem olhou se o farol tava verde pra correr atrás do suíno. Mas o adversário já tinha sumido pelas ruas de Sampa e, àquela altura, deveria estar sacaneando outros corintianos uniformizados pelas calçadas. Com a certeza de que nunca mais os encontraria, porque se encontrasse, dependendo do resultado do jogo, não ia ter vergonha que bastasse.


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